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partitions / partituras

canção da nostalgia

1.

Sou sereia que em terra naufragou

junto à praia que a espuma fez macia.

Chora o farol, no escuro, sobre o cabo,

com soluços de luz e nostalgia.

 

 

2.

Os meus pés andarilhos e suados

dão o grito que calo, por cansada,

mas sigo este caminho de recusas,

de quimeras sem norte e sem morada.

 

 

3.

Filha das trevas, da noite mais negra,

nas estrelas brilhantes à procura

duma canção que em coro me cantasse

ternas albas de calma e de doçura.

 

 

4.

Nas ilhas de lá longe eu descobri

as lágrimas de mel e de magia,

um modo resistente e libertário,

o insubmisso gesto de rebeldia.

 

 

5.

O punhado de terra que se esconde

no regaço da minha mão fechada

será doce memória que me siga

pelas sendas agrestes de exilada

Paulo Barrosa

canção proibida

soneto do amor livre

1.

Proscrita é a voz

Que grita e não cala

A raiva que estala

Quando estamos sós

Assim nós ficamos

A cerrar os dentes

Nas mãos as sementes

Que não semeamos

 

2.

Está por toda a parte

O duro cantar

De vir ou rachar

Sem jeito nem arte

Mais fero que manso

Efeito sem causa

Em busca da pausa

De um magro descanso

 

3.

Pele ao abandono

Macia e suada

Agora molhada

Na noite sem sono

Do sémen que nasce

Na flor das marés

Dos dedos dos pés

Aos olhos da face

 

4.

Desejo que queima

Por dentro e por fora

Sempre à mesma hora

Em penosa teima

A trova emudece

Se a morte o levar

Se a cidra acabar

A noite arrefece

 

5.

Porque mata e mói

Calar esse pranto

Ai que custa tanto

Saber onde dói

Venha o que vier

Nós sempre morremos

Dos medos que temos

Num longe qualquer

Paulo Barrosa

1.

Livre, me faço escrava num segundo.

Antes livre este corpo que me veste,

para que à volta dele nada reste

do mal que lhe faz ter de estar no mundo.

 

 

2.

São cascatas de mãos e de surpresa

nas minhas ancas soltas, tão abertas.

São paisagens distantes, tão incertas,

de alma à solta às carícias indefesa.

 

 

3.

Grito surdo de que sinto nascer

no meu centro uma fonte de água pura

e uma morte que quase nada dura,

que deixa uma outra morte apetecer.

 

 

 

Cheira a mar, sabe a campos de aloés

o esperma que me escorre pelos pés

Paulo Barrosa

canção do pássaro azul

1.

Meu pássaro azul

Que fazes o ninho

Faz com que o sol nasça

Mui devagarinho

 

Mui devagarinho

P’rás bandas da aurora

Que chegue o amigo

Sem outra demora

 

2.

Sem outra demora

Se escuta o cantar

Da linda sereia

No fundo do mar

 

No fundo do mar

Das bandas do norte

Será minha sina

Amiga da sorte

 

3.

Amiga da sorte

Que vive nas fontes

Das águas que correm

Do cimo dos montes

 

Do cimo dos montes

P´rás bandas de aqui

Assim fez a morte

Quando eu lhe sorri

 

4.

Quando eu lhe sorri

Se pôs ao caminho

O meu doce amigo

Vem mui de mansinho

 

Vem mui de mansinho

Das bandas do sul

Faz com que o sol nasça

Meu pássaro azul

Paulo Barrosa

variação sobre o tema da nostalgia

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